sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Trinity Blood: Obra de Erudição Inigualável


Light Novels são o intermédio entre a literatura e a animação japonesa. São um poderoso

canal de intertextualidade e transmissão de conhecimento, frequentemente levando a
sabedoria dos clássicos até os olhos. Façamos o famoso experimento de combinação: O que
aconteceria se A Canticle for Leibowitz incluísse vampiros? A resposta a tal pergunta é algo
próximo a Trinity Blood.

A obra de Sunao Yoshida fala sobre uma realidade pós-apocalíptica onde após uma guerra
nuclear a humanidade fica dividida em duas facções: Os Humanos – Ou Terran –, que estão
fragmentados em reinos sob a liderança do Vaticano, e os Vampiros – Ou Methuselah -, sob a
égide do Império dos Verdadeiros Homens e seus estados vassalos. O protagonista é o
atrapalhado padre Abel Nightroad, cuja tolice é motivo de chacota para os fieis, contudo tal
simpático cura esconde um terrível segredo.

O universo como um todo foi muito bem construído: O Império é uma reminiscência dos
Otomanos: São reproduzidas as fronteiras e mesmo o sistema de Estados Clientes –
Marquesado da Hungria, Ducado da Boêmia, etc. -, havendo um sultão, um grão-vizir e outros
cargos de origem semítica junto com títulos nobiliárquicos ocidentais como Duquesa de Kiev
ou de Cartum. Já os países ocidentais são réplicas de estados medievais.
Sobre estes últimos pesa um detalhe: A fixação do autor pelo latim e pela cultura romana em
geral. A Inglaterra futura chama-se Albion e sua capital é Londinium; a França é Gallia, com o
trono situado em Lutetia. Tal mania vai ao extremo do uso de frases como “Igne Natura
Renovatur Integra” como senhas de uma blackbox.

A Igreja Católica age como a maior potência militar e tecnológica do cenário futuro: Ela
controla um vasto território no Mediterrâneo, e tem como único rival o Império. Tal Vaticano é
inspirado no período do Renascimento: Existem intrigas morais e conspirações ao lado da
sempre inerente aura de santidade. Enquanto a religião é um tema central, o papel do
sobrenatural nunca é deixado claro. Seriam os micro-organismos e nanorrobôs que deram
origem aos vampiros obra divina ou mero fenômeno natural de origem extraterrestre?

Tais perguntas e muitas outras nunca foram respondidas: Sunao Yoshida morreu
precocemente, de uma infecção na língua, deixando sua maior criação inacabada. A Gainax de
Hideaki Anno o tinha chamado para fazer uma colaboração em um anime chamado Bushilord,
que pelo triste incidente nunca saiu do papel. Seus assistentes criaram um final com base em
anotações esparsas, que serviu apenas de tímido remendo...

domingo, 8 de setembro de 2013

Hiro Mashima Contra o Novo Mundo




Revelar as nuances ocultas do mainstream... Uma das propostas do nosso blog... Como Cristo, Sócrates e Chacrinha não viemos para explicar, e sim para confundir. Estamos cansados da desmistificação: resgataremos a mística perdida!

Na mania de tentar fazer exegese de mangá, já passamos a navalha em Bleach, Naruto, One Piece, entre inúmeros outros battle shounen... Nas intermináveis sessões de paralelologia mangafila, sempre fui perguntado... Qual o significado de Fairy Tail? Por muito tempo fui incapaz de dar respostas aptas... No entanto, com o passar dos arcos, algo foi ficando cada vez mais claro...


Como é o mundo que Hiro Mashima criou para esta obra? Uma sociedade feudal, em que a economia, além de uma nascente burguesia – Sendo, entre outras, a família Heartphilia exemplo desta -, é controlada por várias fortes guildas organizadas à moda pré-revolucionária, entre elas as de magos mercenários. O seu mapa-mundi curiosamente parece uma corruptela da Europa pré-contemporânea. O óbvio é que toda a temática tem um forte componente de medievalismo. E todo este sistema é visto de modo simpático.

Qual o tema de Fairy Tail? O perpétuo embate entre a ordem e a liberdade.

As autoridades mais do Reino de Fiore e pelo Conselho Mágico[1]. O primeiro é uma instituição retratada com certa simpatia: A sua nobreza, com raras exceções, como Everlue, parece estar realmente preocupada com o bem-estar da sua nação. Já o segundo é uma assembleia de magos burocratas que de arco em arco revelam a sua inutilidade e seu desprezo por tudo o que vai contra os seus vagos interesses políticos, o clássico poder global que veta e sufoca as soluções eficazes – Qualquer semelhança com a Liga das Nações, ONU et caterva é mera sátira...

De modo geral a maioria dos antagonistas é de facções – Oracción Seis, Grimoire Heart, entre outras – que querem criar um novo mundo, destruindo assim a sociedade vigente. Fica claro que todos estes, tal como em todas as revoluções, ainda que às vezes bem-intencionados e simpáticos, entram em estado de corrupção, ficam ébrios pelo poder e de modo maquiavélico irão quebrar todos os ovos – E cabeças – na omelete necessária para atingir os seus delírios.


Então, o que representam os herois? O ponto ideal em tal conflito. Em suma, é o ideal do autor: O espírito lúdico que vive na tradição sem quebrá-la. O despojamento da rebeldia jazente na sombra. Isto é a Fairy Tail.